Técnica rigorosa, Dilma busca agora sensibilidade política
Por Jeferson Ribeiro
BRASÍLIA (Reuters) - Dilma Rousseff dará à Presidência da República um caráter mais gerencial. Essa é uma avaliação geral de aliados e analistas políticos sobre a gestão da petista, que também precisará desenvolver habilidade política para cumprir suas promessas e suceder o presidente mais popular do país.
Conhecida por cobrar com rigidez o cumprimento de prazos e metas, Dilma aprendeu com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e na campanha eleitoral a usar um pouco mais o coração quando o assunto é política.
Assessores contam que depois de ser escolhida por Lula para concorrer à Presidência não foram poucos os dias em que eles se sentavam no gabinete presidencial e ficavam horas conversando, como se Lula desse aulas à sucessora.
Parte da personalidade firme de Dilma foi construída durante os anos de chumbo, quando ela ingressou em organizações clandestinas para combater a ditadura militar depois de passar no vestibular do curso de Economia da Universidade Federal de Minas Gerais.
Filha de um próspero imigrante búlgaro que fugira da opressão política no seu país, a militante rebelde foi presa e torturada por três anos, entre 1970 e 1973. Recomeçou a vida em Porto Alegre, aos 26 anos, onde desenvolveu suas qualidades gerenciais nos cargos públicos. Foi secretária de Energia e Fazenda.
Num café da manhã com o chefe do gabinete pessoal da Presidência da República, Gilberto Carvalho, ela chegou a lamentar que a vida pública a tivesse tornado uma mulher de gabinetes e com pouca ligação popular.
"Ela contou que tinha medo de, por isso, ser uma política artificial, como aqueles que pegam criancinhas no colo só para tirar fotos", contou Carvalho à Reuters.
A fama de dura que gira em torno da futura presidente foi ironizada por ela num discurso de 2009. "Eu sou uma mulher dura, cercada de homens meigos", disse em um evento para mulheres.
Mesmo com a ironia, durante a campanha eleitoral sempre que um assessor ou um aliado não queria levar a ela um pedido, com medo de ser repreendido, o interlocutor usava uma saída que se tornou uma espécie de bordão: "Você sabe como é a Dilma".
O bordão deve ser usado muitas vezes nos próximos anos por aliados e assessores para evitar as broncas de Dilma. Broncas que, segundo o compadre de Lula, o governador de Sergipe, Marcelo Déda (PT), nunca foram duras como as do próprio Lula. "O presidente nunca perdeu sua origem de metalúrgico", disse em referência às cobranças que ele faz a seus comandados.
"DE FERRO, MAS SENSÍVEL"
Os mais próximos comentam, no entanto, que a campanha eleitoral e a vida fizeram de Dilma uma dama-de-ferro que não perdeu a ternura.
Para Déda, esse perfil de gestora que cobra duramente é essencial para presidir o país. "Nenhum presidente resiste no cargo se não tiver parte de sua personalidade feita de ferro. E ninguém tem sucesso na política se permitir que o ferro seja o material absoluto no seu perfil", disse.
"A Dilma é de ferro, mas também é sensível como um ramo de flor que é balançado pela brisa de vez em quando", filosofa Dedinha, como o governador é chamado por Dilma.
Após o primeiro debate na TV durante a campanha do segundo turno, quando Dilma adotou uma estratégia de ataques ao adversário José Serra (PSDB), Carvalho lembra que usou uma metáfora de boxe para comentar o desempenho da presidente. "Eu disse a ela: 'você deu um cruzado de esquerda no Serra'. E ela respondeu: 'eu acho que eles me subestimaram muito. Na vida a gente vai aprendendo'", relembra o assessor de Lula.
A determinação da presidente também foi fundamental em outro momento da sua vida para não abrir mão de seus planos. Em abril de 2009, ela revelou que estava com câncer no sistema linfático. Após passar por tratamento quimioterápico e retirar um pequeno tumor, os médicos anunciaram que estava curada.
ENIGMA
Dilma se lançou na campanha como um enigma até para alguns círculos políticos em Brasília. O nome era reconhecido por menos de 10 por cento dos eleitores, e a indicação não foi bem recebida por alguns membros do PT, que desejavam um candidato mais conhecido e experiente.
Talvez isso também explique por que, desde o primeiro dia, sua candidatura trouxe a mensagem de continuidade total das políticas de Lula, aparecendo ao seu lado em comícios e na TV sempre que possível.
Ela chega ao governo com a promessa de criar milhões de empregos, melhorar a infraestrutura do Brasil e manter e ampliar os programas sociais. Somado a isso, ela segue a cartilha de políticas pró-mercado que tornaram seu ex-chefe amplamente aceito.
Dilma deve comandar uma expansão ainda maior da presença estatal no estratégico setor do petróleo, segundo seus assessores, e bancos estatais vão continuar tendo uma participação importante na economia.
Mas os temores de que governe à esquerda de Lula, manifestados por alguns investidores e políticos de oposição, parecem ter sido acalmados, ao menos por ora, especialmente com a definição de um ministério com várias figuras do governo anterior.
Os próximos quatro anos servirão para mostrar se a mineira de 63 anos conseguirá equilibrar rigidez técnica, obstinação e habilidade política para superar os desafios que terá que enfrentar.
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