quarta-feira, 30 de junho de 2010

"Bolsa eleição" não tem limites

"Bolsa eleição" não tem limites

Calcula-se que teremos um índice de renovação de bancadas superior à média das últimas décadas, em torno de 50%.

Não estará errado quem multiplicar, pelo menos por dois, qualquer previsão dos políticos e dos partidos sobre os gastos oficiais de campanha neste ano. Corre o risco, isso sim, de ser excessivamente conservador. A "bolsa eleição" não tem limites – o que está levando alguns poucos possíveis candidatos, assustados, a desistir de concorrer. E uma boa maioria a perder o sono.

Histórias que se ouvem em Brasília, se não de arrepiar, são de deixar qualquer um preocupado. A começar pela admissão, mais ou menos explícita, de que os caixas dois, três, ou "n" estão em alta. Admite-se que as empresas de maior peso, com boa governança corporativa, ou não vão ajudar ou farão apenas o jogo aberto, ultralegal. E é nesse ponto que está o perigo, ou seja, de onde virá o dinheiro que sustentará as caríssimas máquinas de campanha que estão sendo montadas. É um sorvedouro de dinheiro sem fim: campanha presidencial, campanha para governador, campanha para senador, campanha para deputado federal, campanha para deputado estadual.

Com a ação mais dura – e ainda assim muito branda, devido à falta de instrumentos mais eficientes – da Justiça Eleitoral em relação aos gastos eleitorais de partidos e candidatos, evidenciada nas eleições municipais de dois anos atrás, deixou muito colaborador, patrocinador, investidor ressabiado.

A vigilância da imprensa, divulgando a lista de colaboradores, também leva ao refluxo do contribuinte. Ter o nome ou a marca ligada a um político com eventuais suspeitas, mesmo que tudo tenha sido feito legalmente, não é agradável. Por essas e outras tem crescido, de eleição para eleição, a contribuição entregue ao partido – em detrimento dos investimentos individuais. O que vai para o partido entra num bolo e não se identifica para quem foi redistribuído.

Por isso, registra-se em Brasília, os colaboradores financeiros mais confiáveis estão escasseando. O que está levando a um fato não registrado anteriormente, a não ser como exceção: alguns políticos estão aceitando um rebaixamento de status para ter parceiros endinheirados que lhes garantam recurso. Tal coisa já era observada no caso dos senadores: muito suplentes, no primeiro e segundo graus, ganham vaga porque são bons assinantes de cheques.

Agora, a coisa está mais radical: há deputado federal que se disponha a voltar para seu rincão, como deputado estadual, em dobradinha com algum abonado que queira ir para a Câmara em Brasília e se disponha a investir no mandato. Há pelo menos dois senadores que também farão um dowgrade, atravessando o corredor que liga o Senado à Câmara na capital federal.

Tem mais ainda tirando a soneca dos políticos instalados em Brasília e mesmo nos legislativos estaduais: colaboradores frequentes de outras campanhas, alguns setores tradicionalistas, daqueles que têm muita sinergia com o setor público, estão optando, em lugar de financiar políticos profissionais, por ajudar a eleger algum executivo de sua própria companhia ou de estrita confiança do setor. É o tal: nada de intermediários, quem é do ramo sempre é de mais confiança.

Nada de ilegítimo, em princípio, numa ação dessas; pode ser até positivo porque pode levar para o Congresso executivos e administradores bem qualificados tecnicamente e não apenas políticos especialistas nas artes da político. O tempero pode ser bom. Mas se não foi bem misturado, pode desandar.

O processo está em curso, com a previsão, a partir das desistências, da chegado desses novos "políticos" e da força dos financiamentos extras, de que o Congresso futuro terá uma cara e um tipo diferente do atual. Admite-se que teremos um índice de renovação de bancadas superior à média das últimas décadas, tradicionalmente em torno de 50%. Se para melhor ou para pior, não dá para imaginar. Só podemos torcer para que as trocas não sejam apenas substituição de nomes.


José Márcio Mendonça é jornalista e analista político

Jornal Diário do Comércio de SP

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